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Síndrome de burnout: quando o trabalho nos faz “pegar fogo”

  • Foto do escritor: Diego Pedrosa
    Diego Pedrosa
  • 19 de nov. de 2024
  • 4 min de leitura

Atualizado: 16 de dez. de 2024


Uma pessoa nervosa e cansada
Uma pessoa nervosa e cansada

A complexa relação entre ser humano, trabalho e saúde mental é algo cada vez mais analisado nos dias de hoje. A constatação estatística do aumento do adoecimento laboral, especialmente através de sua relação com diagnósticos psicopatológicos clássicos, como transtornos de ansiedade e depressão, é uma situação preocupante e que demanda ações concretas para uma melhoria do quadro. Para além desses diagnósticos, entretanto, ao longo de anos de pesquisa no setor, foi descrito um modo de sofrimento próprio das relações de trabalho, isto é, um problema especificamente ocupacional: a síndrome de burnout. Essa síndrome foi integrada, inclusive, à última versão da Classificação Internacional de Doenças (CID), publicada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022. Enquanto a CID-10 simplesmente categorizava o sintoma "esgotamento" (Z73.0) para se referir ao problema, a publicação atual (CID-11) apresenta uma categorização específica para burnout (QD85), definindo-o por "uma síndrome conceituada como resultante do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso". Ela pode apresentar comorbidade com outros quadros psicopatológicos e, até mesmo, desencadeá-los, como burnout seguido de transtorno depressivo (Trigo, 2007).


HISTÓRICO DO TERMO


A palavra inglesa burnout deriva do verbo “to burn out”, que significa “queimar por completo”, “consumir-se”. O psicanalista alemão Herbert J. Freudenberger (1926-1999) foi quem utilizou o termo pela primeira vez, na década de 1970, para se referir a uma “síndrome psicológica”, descrita por ele como uma sensação de fracasso, desgaste ou exaustão devido ao uso excessivo de energia, força ou recursos pessoais (Freudenberger, 1974). Ele tomou por base, inicialmente, a sua própria experiência de trabalho clínico durante muitas horas diárias. Posteriormente, realizou pesquisas visando explorar e confirmar a síndrome como uma consequência do estresse crônico decorrente do trabalho.  


A CONCEPÇÃO ATUAL DA SÍNDROME


Na década de 1980, por sua vez, uma nova concepção e amplamente reconhecida do conceito de burnout foi desenvolvida pela psicóloga social estadunidense Christina Maslach (1946-). Ela descreve a síndrome a partir de três eixos sintomáticos: exaustão emocional, despersonalização e baixa realização profissional (Maslach & Jackson, 1981). A exaustão emocional se refere a uma sensação de fraqueza, falta de energia e entusiasmo para enfrentar os desafios relacionados ao trabalho. Muitas vezes, se expressa pelos sentimentos de desesperança, solidão, tristeza, raiva, irritabilidade e tensão. A despersonalização se configura como um distanciamento afetivo do trabalho, isto é, uma sensação de indiferença ou uma atitude negativa em relação ao ambiente, aos colegas e clientes, de modo que todos esses elementos podem ser percebidos como desagradáveis pelo sujeito. Já a diminuição da realização profissional, uma consequência esperada da exaustão emocional e da despersonalização, corresponde a um sentimento geral de frustração profissional, de forma que tanto a execução do trabalho, quanto os seus resultados parecem sem valor. O texto da CID-11, aliás, descreve a síndrome baseada nessas três dimensões analisadas por Maslach.


FATORES DE RISCO


Quanto à propensão ao desenvolvimento de burnout, podemos dizer que há fatores de risco subjetivos e objetivos. Os fatores subjetivos estão relacionados a traços de personalidade do sujeito em questão, isto é, pessoas intolerantes, autoritárias, controladoras, com padrão rígido de pensamentos e com baixa autoestima, por exemplo, têm maior predisposição ao desencadeamento da síndrome. Entretanto, há uma gama de fatores objetivos, ou seja, externos ao sujeito, que apresentam um papel essencial na etiologia do burnout, que seriam as condições de trabalho pelas quais a pessoa é submetida. Esse aspecto envolveria desde questões específicas relativas à organização trabalhista e às características do país em que o trabalhador habita (se é um país de centro ou de periferia do capitalismo, de há leis efetivas na proteção da qualidade de vida do trabalhador, se há seguridade social, o perfil da jornada de trabalho, a remuneração, a liberdade de escolha profissional, o nível de oportunidades, o tempo de deslocamento até o local de trabalho, etc.), a questões mais gerais, referentes à organização econômica mundial que contemplamos no século XXI, na qual o tempo de serviço dos trabalhadores é também tratado como uma mercadoria. Assim, não podemos cair no equívoco de querer explicar a síndrome de burnout através de fatores exclusivamente psicológicos, pois a temática socioeconômica não só é extremamente relevante, como pode mesmo ser prioritária.


CONCLUSÃO


Posto isso, devemos compreender que há uma importante diferença entre estresses eventuais decorrentes do trabalho, ou seja, reações a problemas temporários e não graves, para os quais logo são encontradas saídas, de estresses permanentes, crônicos, que vão progressivamente se agravando e que, posteriormente, podem resultar no adoecimento do trabalhador. Como foi dito, o desenvolvimento da síndrome de burnout é multicausal, isto é, decorre da combinação de vários fatores que agem ao mesmo tempo, desde elementos psicológicos a socioeconômicos. Portanto, ainda que a causação não se restrinja ao âmbito da saúde mental, um suporte psicológico pode auxiliar o sujeito a entender o fenômeno que está por trás de seus sintomas e, desse modo, propiciar melhores condições de enfrentamento e busca de saídas positivas e saudáveis para o seu problema.


REFERÊNCIAS


Freudenberger, H. J. (1974). Staff Burn-Out. Journal of Social Issues, 30 (1), 159-165.

Maslach, C., & Jackson, S. E. (1981). The measurement of experienced burnout. Jounal of Ocuppational Behavior, 2, 99-113. https://doi.org/10.1002/job.4030020205

Organização Mundial da Saúde. (2011). CID-10: Classificação internacional de doenças e problemas relacionados à saúde. Artmed.

Trigo, T. R. et al. (2007). Síndrome de burnout ou estafa profissional e os transtornos psiquiátricos. Revista de Psiquiatria Clínica. (São Paulo) 34 (5) • 223-233, 2007 https://doi.org/10.1590/S0101-60832007000500004

World Health Organization. (2022). ICD-11: International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems. Disponível emhttps://www.who.int/classifications/classification-of-diseases 


 
 

DR. DIEGO PEDROSA

CRP 04/27767

(32)98423-7954

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